CÂNCER E EMOÇÕES



    Poucas doenças demonstram ser tão dependentes de uma causa multifatorial como o câncer. Esses fatores, como acontece em tantas outras situações patológicas, representam influências constitucionais e ambientais.

1. Trata-se de uma doença geneticamente determinada e constitucionalmente programada;

2. Necessita sempre, para seu desenvolvimento, de alguma falha do sistema imunológico do organismo em algum momento;

3. É sujeita às várias influências ambientais, como os raios ultravioletas, camada de ozônio, poluição, várias substâncias tóxicas, etc.

4. Também depende da influência do estilo de vida, como por exemplo, fatores alimentares;

5. Pode ser decorrente da ação de múltiplos agentes virais;

6. É susceptível à influência de fenômenos de estresse e a fatores psicológicos vários, quer em sua origem quer em sua evolução.

   Imunologicamente, sabemos que no sangue, as células (linfócitos), chamadas de "natural killers", têm a função de vigiar a existência de qualquer célula anômala e proporcionar sua pronta destruição. Essa tarefa que os linfócitos executam do nascimento até a morte é chamada de vigilância imunológica.

   Se, em qualquer momento de nossa existência, essas células procederem alguma falsa leitura, podem ocorrer diversas doenças. Quando reconhecem como anômalas células normais do organismo e, devido a esse falso reconhecimento, procederem sua destruição, estaremos diante das doenças chamadas Auto-Imunes. Se, pelo contrário, elas não "perceberem" a existência de células realmente anômalas, poderão negligenciar sua tarefa de vigilância imunológica. Nesse caso quem aparece é o câncer.

   Assim sendo, muito embora os cânceres sejam vários, alguns bem localizados em determinados órgãos ou regiões, a doença em si é global e corporal.

   Sendo então o câncer uma doença integral da pessoa, ele deve ser o reflexo de suas relações, sejam relações com o mundo objectual (ambiente), sejam suas relações consigo própria.

   Muitos autores concordam em afirmar que os pacientes de câncer costumam ter em comum, o fato de terem perdido alguma parte de suas relações antes de apresentarem a neoplasia. De um modo geral, há muito tempo os clínicos estão cientes sobre a influência do trajeto neuro-endócrino e da ação do hipotálamo na resposta imunológica do organismo, bem como, e por causa disso, na origem e no curso do câncer.

   Embora seja cada vez maior o número de pesquisadores que reconhecem o papel dos fenômenos psíquicos e psicossociais no desenvolvimento do câncer, também é grande o número de médicos que não dão atenção psicológica suficiente aos seus pacientes, ou no mínimo, que os encaminha a um profissional especializado (Miller TR - 1977).

   Fatores sócio-culturais possivelmente associados ao desenvolvimento do câncer já foram investigados há décadas, mediante extensos questionários e avaliações minuciosas. Diferenças de classes sociais, de atividades ocupacionais, de elementos ambientais e do estilo de vida, foram associadas aos variáveis riscos para o câncer. Essas pesquisas têm apontado cada vez mais para os componentes emocionais e comportamentais associados ao desenvolvimento de doenças malignas (Cox T; Mackay C 1982).

Personalidade Tipo C de "câncer"

    As pesquisas sobre o estresse como um fator importante, entre outros, na origem e na evolução clínica da doença maligna têm mostrado elementos interessantes. Assim como cardiologistas mais observadores e sensíveis detectaram a Personalidade A, associada à causa e/ou agravamento das coronariopatias, também os oncologistas, com as mesmas qualidades holísticas de seus colegas da cárdio, conceituam e delineiam uma Personalidade Tipo C , onde o risco maior seria para o câncer.

   Nessa personalidade haveriam traços proeminentes de negação das experiências mais traumáticas, supressão das emoções e tendência à raiva. Outras características deste padrão personal seria amabilidade excessiva (e às vezes contrariada), não reconhecimento dos conflitos, aspiração social exagerada, comportamento forçosamente harmonioso, paciência desmedida (às vezes dissimulada), racionalidade contundente e um rígido controle da expressão emocional.

   Os pesquisadores consideram, para a Personalidade Tipo C, que o uso excessivo da negação e da repressão (mecanismos de defesa), bem como a dissimulação dos sentimentos são importantes fatores ligados ao desenvolvimento tumoral. Para essa forma e estilo de reagir à vida, os estressores psicosociais estariam associados à diminuição da imuno-competência orgânica e, conseqüente à essa alteração, ao desenvolvimento do câncer. Também o risco de metástases de um câncer já tratado estaria significativamente influenciado pela reação da Personalidade Tipo C com o tipo e a duração dos estressores psicossociais (Baltrusch HJ, Stangel W, Titze I - 1991).

   Nessas pesquisas, as pessoas com evolução mais favorável eram aquelas com espírito mais combativo, com maior potencial para a agressividade cotidiana e com poucas tendências a suprimir as manifestações das emoções.

   Atualmente, os pesquisadores recomendam a aplicação de inventário padrão universal (teste, entrevista) para avaliar o presumível comportamento característico da vulnerabilidade ao câncer (Personalidade Tipo C). Alguns modelos desse inventário já são oferecidos para a investigação (Greer S, Watson M - 1985).

Fatores Psíquicos e Sociais

    As exigências sociais e psicológicas parecem cada vez mais associadas ao desenvolvimento do câncer. Tentatively (citado por Cox T e Mackay C) , sugere que dois grupos principais de fatores possam estar relacionados a um risco aumentado do câncer: primeiramente, a perda de uma relação importante (freqüentemente pai, mãe, filho ou cônjuge) e, em segundo, uma grande inabilidade em expressar sentimentos (hostis, irritáveis, etc) ou uma liberação inadequada da emoção.

   Entre esses sentimentos de perda de relações, o luto parece desempenhar papel preponderante. Já foram publicados trabalhos onde se estabelecem relações entre sentimentos de perda, vergonha, desesperança ao surgimento de linfomas, leucemia e outros tipos de câncer. Sentimentos tais como a perda de uma relação significativa, a incapacidade de expressar sentimentos hostis, uma importante tensão em relação a uma figura parental, sentimentos de desamparo e de desesperança frequentemente se associam ao surgimento do câncer.

   Os diversos mecanismos psicofisiológicos que relacionam as emoções com o início do câncer, adquirem força quando se considera o papel do sistema nervoso central na regulação do sistema imunológico. Tem-se verificado que a função imunológica do organismo, mais precisamente a resposta imunológica à estimulação linfocitária, era suprimida em viúvos nos primeiros meses que se seguiam à morte da esposa. Uma supressão menos pronunciada era também observada do quarto ao décimo quarto mês de luto.

   Os fatores psicossociais de risco ao desenvolvimento do câncer, segundo alguns autores, distinguem-se em indiretos e diretos: os fatores indiretos são definidos como as atitudes psicossociais da pessoa que conduzem à probabilidade de câncer aumentada, dependendo pois, dos traços de sua personalidade e da maneira de reagir à vida, relativamente independente dos estressores do cotidiano.

   Já os fatores diretos seriam os estresses psicossociais, propriamente ditos, que induzem as reações psicológicas que podem conduzir às transtornos físicos-imunológicos do organismo. Portanto, um dos fatores diz respeito mais às características pessoais e o outro às exigências ambientais (Hürny C - 1984). Em nosso entendimento esses fatores deveriam chamar-se subjetivos e objetivos, ou ainda, psíquicos e sociais, respectivamente.

   Esse tipo de raciocínio nos faz crer que, embora uma perda pessoal significativa (morte do cônjuge, p. ex.) possa ser considerada mórbida bastante para o desenvolvimento do câncer, esse evento sozinho poderá não ser suficiente. Há pois, necessidade de um tipo pessoal e próprio de reação psicológica à perda para, aí sim, aumentar-se o risco do câncer.

   Assim sendo, as evidências convergem para fatores que parecem predispor algumas pessoas, mais que outras, a desenvolver o câncer ou fazê-lo progredir mais rapidamente através de seus estágios de desenvolvimento. Estes fatores incluiriam:

a. Determinados traços da personalidade ou estilos de lidar com a realidade, definidos como Personalidade Tipo C;

b. Dificuldades da pessoa expressar suas emoções com clareza e sinceridade e;

c. Uma atitude ou tendência exagerada para solicitude e compreensibilidade dos outros (Temoshok L - 1987).

   Uma das principais investigações em relação aos fatores de risco psicosocial na mortalidade por câncer foi realizado por Grossarth (1985) et al. Ele procurou corroborar um estudo anterior Kissen (1963), o qual trabalhou por muitos anos com câncer de pulmão, publicou vários trabalhos baseado nos casos que atendeu e na aplicação de testes psicológicos (Maudsley, Personality Invenrory). Esse autor postulou que os pacientes com câncer de pulmão apresentavam uma típica tendência a suprimir suas emoções e seus conflitos. Por causa disto eles teriam uma saída muito dificultada para a descarga emocional.

   Grossarth estudou 1353 habitantes de Crvenka, incluindo 619 mortos entre 1966 e 1976. Todas mortes por câncer de pulmão ocorreram em pessoas com elevada racionalidade e elevada dificuldade para exteriorizar as emoções, incluindo a supressão da agressividade.

   Na tentativa de analisar as características de personalidade nos portadores de câncer, os autores observaram que a desesperança era um sentimento tão presente nesses pacientes como era a raiva em relação às doenças do coração. Conclui sua pesquisa atestando que as variáveis psicossociais eram importantes o suficiente para modificar, decisivamente, os efeitos de outros fatores de risco físicos, como por exemplo, o hábito de fumar na mortalidade por câncer (Grossarth Maticek R; Bastiaans J; Kanazir DT - 1985).

Bibliografia

Baltrusch HJ, Stangel W, Titze I - Stress, câncer and immunity. New developments in biopsychosocial and psychoneuroimmunologic research. Acta Neurol - Napoli - 1991 Aug, 13:4, 315-27.

Cox T; Mackay C - Psychosocial factors and psychophysiological mechanisms in the aetiology and development of cancers. Soc Sci Med, 1982, 16:4, 381-96.

Greer S, Watson M - Towards a psychobiological model of câncer: psychological considerations - Soc Sci Med, 1985, 20:8, 773-7.

Gross J - Emotional expression in câncer onset and progression - Soc Sci Med, 1989, 28:12, 1239-48.

Grossarth Maticek R; Bastiaans J; Kanazir DT - Psychosocial factors as strong predictors of mortality from câncer, ischaemic heart disease and stroke: the Yugoslav prospective study - J Psychosom Res, 1985, 29:2, 167-76.

Hürny C - The psyche and câncer - Schweiz Med Wochenschr, 1984 Dec, 114:49, 1827-33

Mello Filho J - Psicossomática Hoje - Ed. Artes Médicas - 1992

Miller TR - Psychophysiologic aspects of câncer: the James Ewing lecture - Cancer, 1977 Feb, 39:2, 413-418

Temoshok L - Personality, coping style, emotion and câncer: towards an integrative model - Cancer Surv, 1987, 6:3, 545-6
7.





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