Por que gostamos de ver as lutas de MMA na TV?

Por que gostamos de ver as lutas de MMA na TV?

Camila Neumam
Do UOL, em Porto Alegre* 

  • Assistir a uma luta causa uma mistura de emoções, como a sensação de vingança

    Assistir a uma luta causa uma mistura de emoções, como a sensação de vingança 

Por que assistir a alguém apanhar até sangrar, como acontece no MMA e nos filmes de ação, soa divertido em vez de causar repulsa? Por que se tornou normal nossas crianças assistirem a desenhos animados repletos de tiro, porrada e bomba? Por três razões.

Primeiro, porque a proteção da tela garante que nenhum golpe irá nos acertar, pelo menos não fisicamente, o que ajuda a manter a sensação de conforto. Segundo, porque ver cenas violentas nos ajuda a extravasar nossa própria agressividade, tolhidas em favor da civilidade. Terceiro, porque precisamos manter nossa agressividade natural para garantir a sobrevivência. As três características não implicam em nada patológico, segundo especialistas, a não ser quando há exagero no acesso a conteúdos violentos, especialmente entre as crianças.

Essas são as conclusões de estudos realizados por cientistas do Rio Grande do Sul que estudam a influência da violência no comportamento humano. Os estudos foram abordados no Congresso Internacional do Cérebro, Comportamento e Emoções, que aconteceu em Porto Alegre (RS), no começo do mês.

Lutador de sofá x perigo infantil

"Quando eu vejo a luta livre, o filme ou o desenho animado violento, eu os estou vendo na televisão, dentro de uma estrutura protegida, sentado no sofá, onde posso lidar com todas as ameaças que se apresentarem. Você pode ver qualquer barbaridade, por mais chocantes que sejam, mas seu cérebro vai apontar que ali ninguém pode fazer mal a você", explica o médico Renato Zamora Flores, do Departamento de Genética da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

Além disso, as cenas violentas desencadeiam uma mistura de emoções na nossa mente, ao mesmo tempo em que se vê o mau-trato, surge uma sensação 'boa' de vingança ou mesmo uma ideia de superação.

"Eu posso até ter uma emoção negativa ao ver alguém apanhando, mas essa emoção não vem sozinha. No mesmo instante eu posso dizer 'eu não deixaria isso acontecer', me sentir um herói ou vingado por alguma agressão", afirma Flores, que coordena um projeto de atendimento ambulatorial a vítimas de violência na UFRGS.

O grande perigo da exposição à violência acontece entre as crianças que, diferentemente dos adultos, não têm consciência de que as cenas não devem ser repetidas na realidade. Por isso, o ideal é evitar que elas assistam a isso ou, pelo menos, que contem com alguma orientação de um adulto no momento em que o conteúdo estiver sendo transmitido.
 
"Quanto mais uma criança está exposta à violência, mais ela fica sujeita a situações de risco porque pensa que o que vê na televisão não é perigoso, já que ela só desliga e pronto. Crianças que assistem a mais conteúdos violentos costumam ter um comportamento antissocial", afirma Flores.

Vida civilizada

As lutas livres não são mais do que uma representação de um passado distante, mas que ainda alimenta o imaginário humano, de acordo com os cientistas.

"Os gladiadores se dilaceraram, mas as pessoas também se divertiam com este fato. Agora a pessoa encara novamente essa luta como entretenimento. O cérebro animal e humano estão conectados para também encarar comportamentos agressivos. Se não, por exemplo, um leão passivo não caçaria uma gazela e morreria de inanição", diz o neurocientista André Palmini, chefe do Serviço de Neurologia do Hospital São Lucas da PUC-RS, que estuda os aspectos neurocientíficos da agressividade humana.

Ao tentar diminuir cada vez mais seus impulsos agressivos para viver de forma civilizada, o homem acaba extravasando-os em eventos do cotidiano, e com isso cria padrões agressivos que se banalizam.

"A nossa disputa para ser o primeiro colocado em um concurso é socialmente aceita. Há agressões que também podem ser esperadas dentro de um molde social, como as partidas de futebol. Diante de tudo isso, o ato agressivo tem um componente de prazer, porque dá uma sensação de pertencimento. O UFC é agressivo, não violento, embora lide com a agressividade. É uma oportunidade para as pessoas extravasarem seu lado agressivo, mostrar empatia", diz Palmini.

Agressivos e violentos

Mas por que somos agressivos (comportamento esperado) ou violentos (agressividade considerada patológica)?

A resposta está na evolução do ser humano que precisou se tornar mais agressivo para sobreviver ao longo dos tempos, explica a bióloga Ivana da Cruz, professora de Genética da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

"Todas as espécies precisam comer e se proteger desde que existiram. Mas os estudos evolutivos mostram que o ser humano é o ser mais agressivo da Terra porque ele teve que fazer muito esforço social para sobreviver, passar por instabilidade ambiental, falta de comida, dificuldades meteorológicas. Com o tempo ele desenvolveu ainda mecanismos mais refinados de agressividade, como as agressões verbais e não verbais, que puderam ser socialmente aceitas ou não", afirma Cruz.

Civilizado, restou ao homem criar situações que remetem a esses comportamentos agressivos, como as lutas livres, socialmente aceitas, do que destruir seu oponente cometendo um assassinato -- não aceito e considerado crime.

"Quem quer reviver um comportamento de defesa do grupo vai assistir às lutas, ficar lutando, gritando. É uma representação de comportamentos e os filmes os reforçam porque são moralmente aceitos", diz Ivana.

*A jornalista viajou a convite do Congresso do Cérebro, Comportamento e Emoções

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