| Eletricidade  contra a depressão  Médicos  começam a obter bons resultados no tratamento da doença com o uso  da estimulação magnética  Rafael  Corrêa
   
| Roberto  Setton 
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| O  psiquiatra junto ao aparelho de EMT: "É como ativar uma parte do cérebro  que está falhando" |  A  depressão é um mal cada vez mais comum no mundo moderno. Estima-se  que, em algum momento da vida, atinja 19% dos habitantes do planeta. Segundo projeções  da Organização Mundial de Saúde, se essa porcentagem continuar  aumentando no ritmo atual, até 2020 a depressão se tornará  o segundo maior problema de saúde pública, perdendo apenas para  as doenças do coração. A boa notícia é que  uma nova e promissora técnica de tratamento contra a depressão se  encontra em fase de testes, inclusive no Brasil: a estimulação magnética  transcraniana (EMT). A técnica consiste na aplicação de pulsações  magnéticas repetitivas, produzidas por uma máquina, em uma região  específica do cérebro relacionada à ocorrência da depressão.  As pulsações geram uma corrente elétrica que ativa os circuitos  neurais e restaura a atividade plena dessa região. Nos tratamentos experimentais  são realizadas em média cinco aplicações de estimulação  magnética por semana. Em geral, os resultados começam a aparecer  em menos de um mês.   Combater  a depressão não é simples porque os tratamentos disponíveis  – medicamentos e, nos casos mais graves, choques elétricos –  nem sempre funcionam com todos os pacientes. Com a EMT, os médicos têm  conseguido tratar pacientes que não reagem aos remédios e reduzir  o tempo de tratamento de pessoas com níveis de depressão mais leves.  Não debilitar o paciente nem apresentar efeitos colaterais são vantagens  da técnica. Nos Estados Unidos, a EMT tem sido utilizada em centros de  pesquisa, universidades e hospitais – e os resultados são animadores.  Em São Paulo, os médicos do Instituto de Psiquiatria do Hospital  das Clínicas também a usam de forma experimental. Em boa parte dos  casos, quando combinada com medicamentos antidepressivos, ela reduz o tempo de  recuperação dos pacientes de depressão em até 35%.   O cérebro é um órgão  cujo funcionamento envolve processos químicos e elétricos. Enquanto  os remédios agem na parte química, a EMT atua diretamente nos sinais  elétricos usados na comunicação entre os neurônios.  Por meio de pulsos magnéticos liberados de modo alternado em frações  de segundo, o aparelho induz uma corrente elétrica entre o córtex  pré-frontal, ligado às funções de raciocínio,  e o sistema límbico, no qual se processam as emoções. Estudos  anteriores, feitos com ressonância magnética, demonstram que os neurônios  dessas regiões apresentam baixa atividade nas pessoas que sofrem de depressão.  "É como se a EMT ajudasse a ativar uma parte do cérebro que está  falhando em função da depressão", diz o psiquiatra Marco  Antonio Marcolin, coordenador das pesquisas no Instituto de Psiquiatria. Um paciente  do Hospital das Clínicas, que prefere não ser identificado, diz  que os remédios antidepressão o deixavam relativamente bem, mas  "com a sensação de viver com o freio de mão sempre puxado".  Depois do tratamento com a EMT, ele pôde reduzir a dose de antidepressivos,  que continua a tomar com regularidade.   A técnica de estimulação magnética permite que correntes  elétricas sejam introduzidas também em outras regiões do  cérebro. Por isso, os médicos têm experimentado seu potencial  para tratar outros tipos de distúrbios e doenças. Na Universidade  Wayne de Detroit, nos Estados Unidos, já foram obtidos resultados promissores  no tratamento de vítimas de derrame com perda parcial da capacidade de  fala. Na experiência, os médicos primeiro utilizaram a ressonância  magnética para determinar as áreas lesionadas do cérebro.  Depois, elaboraram um programa de sessões de EMT para estimular regiões  cerebrais que acreditavam estarem tentando assumir as funções das  partes afetadas, acelerando a recuperação do paciente. Numa abordagem  diferente, os médicos da Escola de Medicina de Harvard estão utilizando  o mesmo método para desbloquear os circuitos neurais apenas parcialmente  afetados pelo derrame, mas que o cérebro tenta "desligar", como se estivessem  completamente destruídos. Embora as pesquisas com estimulação  magnética estejam em fase inicial, os pesquisadores não escondem  o entusiasmo quando falam sobre suas possibilidades no tratamento dos males de  um órgão tão complexo como o cérebro. Se os estudos  continuarem nesse ritmo, os pacientes depressivos podem ser os primeiros a usufruir  em larga escala a nova técnica. |